ATA DA SESSÃO PÚBLICA DE REGISTRO DE SALVAGUARDA CONSELHO MUNICIPAL DO PATRIMÔNIO CULTURAL DATADA DE 22/07/2024

Ao vigésimo segundo dia do mês de julho do ano de dois mil e vinte e quatro, as dezoito horas e quarenta minutos, no Auditório A do Cine Teatro Ópera, Ponta Grossa, Paraná, inicia-se a reunião do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural. Conforme Lei nº 13.694/2020, trata-se de uma Sessão Pública de Registro de Salvaguarda, com o objetivo de deliberar sobre a salvaguarda dos bens imateriais, no Município de Ponta Grossa, sendo eles: Festa de Sant’Ana, Festa de Nanã, Devoção a João Maria e Festa do Divino. O Presidente informa que a Sessão compõe a programação da II Mostra de Cultura Religiosa, Fé e Devoção de Ponta Grossa, que será realizada de vinte e dois a vinte e sete de julho. O Presidente realiza a chamada nominal dos conselheiros, no qual se fazem presentes: Alberto Schramm Portugal, Presidente do Conselho e representante da Secretaria Municipal de Cultura; Milena Rocha, da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Planejamento; Luis Cláudio Moutinho, da Secretaria Municipal de Turismo; Andreza Lima Gonçalves de Oliveira, da Secretaria Municipal de Educação; Lorran Dyowany Jasluk de Melo, do Departamento de Patrimônio Cultural da Secretaria Municipal de Cultura; Larissa Pickler Barbosa, do IPLAN; Eliane Terezinha de Oliveira, da Secretaria Municipal da Fazenda; Renato Van Wilpe Bach, da Universidade Estadual de Ponta Grossa; Juliano da Rosa, da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Ponta Grossa; Geraldo Lucas Agner, da OAB; Leonel Brizola Monastirsky, do Grupo Ecológico dos Campos Gerais; Leontina Mendes Stadler, ACIPG; José Aparecido Leal, do CREA-PG; Daluz Aparecida Ribeiro, do CRECI-PG; Kathleen Coelho de Biassio, do CAU-PR; e Maria Luiza Côrtes, do Conventions & Visitors Bureau. O Presidente lembra a todos que a votação é oral e aberta; o relator terá dez minutos para apresentar o processo; e a comunidade terá dez minutos, compartilhados, para se manifestar. O Presidente solicita que a relatora do processo da Festa de Sant’Ana, conselheira Kathleen Coelho de Biassio, apresente seu parecer. Ela destaca que o parecer foi redigido por sua suplente, professora Jeanine Migliorini, e relata que “a devoção à Sant’Ana remonta o princípio da ocupação da região de Ponta Grossa, na Casa da Telha, que possuía um altar, onde o vigário, de Castro, vinha eventualmente realizar cerimônias religiosas. Em quinze de setembro de mil, oitocentos e vinte e três, quando Ponta Grossa foi elevada à Freguesia, pelo Imperador D. Pedro I, Sant’Ana foi declarada, oficialmente, a padroeira da cidade. As comemorações iniciais à santa ocorriam, de acordo com a professora Maura R. Petruski, nos oratórios domésticos, quando as pessoas se reuniam para realizar suas orações coletivas. Encontram-se registros, de mil, oitocentos e quatorze, que destacavam essa devoção, através da unção de um desses oratórios, exigência do Concílio de Trento para altares ou retábulos fora das igrejas, na Chácara Madalena, de Domingos Ferreira Pinto. Nesse momento já se comemorava a santa anualmente, dia vinte e seis de julho, elevando-se um mastro com a bandeira com a imagem de Sant’Ana, esse hábito perdurou até a década de cinquenta. A partir de mil, oitocentos e setenta os registros da festa se multiplicavam, encontrando falas sobre os festejos até nos jornais de Paranaguá. As comemorações à Sant’Ana duravam vários dias, e podiam ser divididos entre os momentos sagrados, novenas, missas, procissão; e os momentos populares, quermesses, cavalhadas, corridas e baile. É essa mescla que tornou a festa tão importante para a cidade, revelando-se um grande evento anual, pelo qual as pessoas aguardavam ansiosamente. Os momentos sagrados eram equivalentes a outros municípios, pois atendiam a determinações da Igreja. Contudo os momentos populares variavam entre as cidades e também entre os tempos em que ocorreram, pois as festas são manifestações populares que se adequam a seu contexto, compõem a cultura dos habitantes, que o representam, e possuem função social, agrupando a coletividade. Para a realização dessa festa muitos eram os envolvidos, criavam-se comissões de clérigos e leigos, que passavam meses organizando tudo. Os primeiros ficavam com os rituais sagrados e os segundos ajudavam nos rituais e assumiam os demais momentos. A preocupação era atingir a todos os públicos, as crianças, os idosos, para que todos participassem. Quando a festa acabava, fazia-se um balanço e já estabeleciam as comissões para o próximo ano, que eram disputadas, pois todos queriam fazer parte daquele momento. O envolvimento popular era significativo, antecedendo a festa eram realizados eventos, como chás musicalizados ou torneiros de futebol, que incluíam grupos musicais, para angariar recursos e tornar a festa possível. Para a divulgação da festa utilizavam-se os jornais locais, cartazes de propaganda, convites formais impressos e o ‘boca a boca’. Em mil, novecentos e trinta e um, o bispo Dom Antônio Mazzarotto assume o controle sobre o conjunto celebrativo, em um momento de romanização da igreja. A festa cresce em importância, encontrando-se registros de mil, novecentos e trinta e nove, a declarando como ‘a festa da cidade’, mantendo-se ativa pelos próximos anos. A partir de mil, novecentos e cinquenta há um esvaziamento da parte popular da festa, em mil, novecentos, e cinquenta e nove os registros apontam para a ausência das barraquinhas externas à igreja, mas são mantidos os festejos religiosos, e em alguns períodos o almoço da padroeira, que permanecem até os nossos dias. Importante destacar que a festa, assim como a devoção, agrega todas as classes sociais do município, então se trata de uma representação coletiva da cultura local, que se modifica ao longo dos anos, assim como se modifica a cidade e a igreja. A história da Festa de Sant’Ana, ao longo de mais de duzentos anos, mostra como ela se adaptou às mudanças sociais, tecnológicas e culturais, mantendo-se relevante e significativa para a comunidade de Ponta Grossa. É mais do que um evento religioso; ela desempenha um papel crucial na preservação da identidade cultural de Ponta Grossa. Através das tradições passadas de geração em geração, a festa ajuda a manter viva a história e a herança dos primeiros colonizadores da região. Neste ano se retoma a parte popular da festa, com a quermesse já anunciada para as comemorações, inclusive, vamos comemorar Sant’Ana na próxima sexta-feira e as barracas já estão montadas na praça. Esse é o parecer.” Na sequência, o Presidente passa a palavra ao público presente, por dez minutos, compartilhados. Sem nenhuma inscrição para fala, por parte da comunidade, o Presidente procede a votação para a inclusão, no Livro Expressões, da Festa de Sant’Ana, sendo deferida por unanimidade entre os conselheiros presentes. O Presidente solicita que o relator do processo da Festa de Nanã, conselheiro Luis Claudio Moutinho, apresente seu parecer. Ele relata: “A Festa de Nanã Burukê no Lago de Olarias. Na celebração dos duzentos anos de Ponta Grossa, há uma dimensão que se perpetua nas relações religiosas da cidade: a discriminação das religiões de matriz africana. A presença das diversas religiões de matriz africana na cidade remonta à sua fundação, trazidas e praticadas por peões de tropa de negros escravizados e que aqui encontraram uma confluência importante para sua visão do sagrado: o culto de Sant’Anna como padroeira do então pequeno vilarejo de pousio de tropas no Capão da Ponta Grossa, santa que era sincretizada com Nanã Burukê, senhora das águas paradas, como lagos e brejos, a mais velha dos Orixás e mãe de vários deles, assim como Sant’Anna foi a avó de Jesus. Este culto foi se radicando de maneira natural pela elevação formal de Sant’Anna como Padroeira da nova cidade. O culto de Nanã, desde os tempos da fundação de Ponta Grossa, é constante nas religiões de matriz africana, sempre sincretizada com Sant’Anna, e sua importância vem até o presente. Esta confluência devocional entre Sant’Anna e Nanã Burukê foi materializada em vinte e seis de julho de dois mil e vinte e três, durante a celebração dos duzentos anos de Ponta Grossa, com a realização da cerimônia do Ojubó de Nanã, no Lago de Olarias. A sacralização inicial do Ojubó, no Ilê Axé Ogum Goolu, foi realizada em cinco de maio de dois mil e vinte e três, e este percorreu diversos templos de Candomblé, Umbanda e Quimbanda para ser cultuado, até o dia vinte e seis de julho, dia em que foi depositado liturgicamente no Lago de Olarias, numa celebração conjunta das religiões afro-brasileiras, um ato de comemoração ao dia de Nanã, mas também dia de sua devoção sincretizada com Sant’Anna. Foi um momento de união e acolhimento mútuo entre o cristianismo e as religiões de matriz africana, num sincretismo que abriu portas para o respeito mútuo e para a queda de barreiras e preconceitos entre as religiões, trazendo perspectivas de paz, união e cooperação interreligiosa. O Ojubó, também chamado de Igbá, que materializou a consagração do Lago de Olarias como ponto de força de Nanã Burukê, era formado por uma pedra consagrada denominada fetiche, previamente lavada com o sumo das ervas da Orixá Nanã, que são, gervão, erva-de-bicho, alfavaca, manjericão e poejo, dentre outras e, ainda, dentro do banho de ervas, recebeu o sangue de uma galinha-de-Angola. Depois disso, todos os artefatos de barro cozido, são oito pratos, uma bacia, uma tigela e uma cuscuzeira, foram lavados no mesmo banho. Também foram lavados os dezesseis búzios; treze pérolas de água doce; duas seguis, conta africana de vidro; sete corais monjolo africanos e quatro favas específicas de Nanã. Também foram banhadas sete colheres de pau, e a ferramenta sagrada de Nanã, chamada de Ibirin. Na sequência, a partir do caldo restante do banho acima, é feita uma argamassa contendo efum, waji, ossum, atim, favas torradas e moídas, terra de brejo e de mangue, e pó de pedra. Também foram incorporados ao Ojubó mel, azeite de dendê e duas sementes de obi, noz de cola. Todos estes artefatos, utensílios e materiais foram montados conforme o ritual, num conjunto que ativa o axé do Orixá, para consagrar o local de seu depósito, o Lago da Olarias, como ponto de emanação de energia e força de Nanã Burukê. A Consagração do Lago: as cerimônias de assentamento do Ojubó principiaram no início da tarde do dia vinte e seis de julho de dois mil e vinte e três. Saindo do Palácio de Maria Padilha, o Ojubó foi em cortejo levado ao Parque Ambiental, onde foi cultuado por diversos templos de religiões afro-brasileiras e simpatizadas no ato do Movimento Cheiro de Axé. A seguir o Ojubó de Nanã foi transportado em procissão até o Lago de Olarias, onde estava sendo aguardado por integrantes de vários templos afro-brasileiros. Lá foi depositado no deck e louvado com os cânticos próprios de Nanã, sendo depois levado a uma embarcação que o transportou ao meio do lago e o depositou submerso no seu leito, onde permecerá, ao longo do tempo, como polo energético de Nanã. Nesse meio tempo, os ogãs e curimbas presentes cantavam louvando calorosamente a divindade, alegres não apenas pelo momento, mas também, e principalmente, pela dimensão social, cultural e histórica do ato para o povo do axé e para cidade de Ponta Grossa. O ato de consagração do Ojubó de Nanã no Lago de Olarias repercutiu fortemente não apenas em nível local, mas também nacional e internacionalmente, principalmente nas páginas, redes sociais e grupos ligados às religiões afro-brasileiras, por ser o terceiro local de consagração pública de um ponto de força dedicado aos Orixás, ao lado do Dique de Tororó e a Pedra de Xangô em Salvador e das Gameleiras de Curitiba. A notícia da consagração chegou até a África, à aldeia de Dassa-Zumé, no Benin, de onde o culto a Nanã se originou. A consagração do Lago de Olarias como ponto de força de Nanã Buruquê não se esgotou no ato do assentamento do Ojubó no Lago. Posteriormente foram realizadas oferendas periódicas e atos em louvor de Nanã. Está prevista uma ação inter-religiosa com a confecção de dois marcos de pedra, um na beira do Lago em homenagem a Nanã e outro em local próximo homenageando a Senhora Sant’Anna, padroeira de Ponta Grossa. O Lago de Olarias será local de uma manifestação unida e conjunta do Candomblé, Umbanda e Quimbanda, uma festa em louvor a Nanã Burukê, que será realizada anualmente no dia vinte e seis de julho, dia da Padroeira de Ponta Grossa e da Deusa do Lago. A Peregrinação, fé e auxílio: a Orixá Nanã Burukê, conforme a tradição oral das religiões de matriz africana, foi a primeira Iabá, Orixá feminina, e seu culto anterior à Idade do Ferro. A palavra Nanã significa raiz, aquela que se encontra no centro da terra. Foi Nanã quem doou o barro fértil do leito de seus lagos e brejos para que Oxalá moldasse o corpo de ser humano, colocando a Orixá no cerne da concepção humana. Assim, seu culto é ligado aos cuidados maternos com o corpo e o espírito de seus devotos. Nanã foi a mais antiga das Orixás, e é mãe de Obaluaê, Oxumarê, Iansã e Ossaim, dentre outros Orixás. Por isso, o culto a Nanã acaba por perpassar a devoção aos diversos Orixás e sua presença. Seu ponto de força no Lago de Olarias está rapidamente se consolidando como local de visita e peregrinação de seus fiéis e tende, com o passar do tempo, a ser um dos principais espaços de turismo religioso em Ponta Grossa, ligado não apenas à sua festa anual, mas também à visitação ao longo de todo o ano. Este texto foi produzido pelo professor Marco Aurélio Monteiro Pereira, assessor de relações institucionais, União dos Templos de Religiões de Matriz Afro-Brasileira e Ameríndia de Ponta Grossa”. No momento é passada a palavra à comunidade. O professor Marco Aurélio Monteiro Pereira agradece ao Presidente do COMPAC e “ao conselho pela sensibilidade e pela iniciativa de dar visibilidade aos invisíveis. Nós vivemos numa sociedade onde a fé, a devoção, a cultura, a sensibilidade religiosa das camadas mais pobres da população, históricamente são renegadas a um ponto secundário, quando não, marginalizadas”, acrescenta que este ato é muito relevante para aqueles que não tem voz e existência, passem a tê-la. Sem mais inscrição para fala, por parte da comunidade, o Presidente procede a votação para a inclusão da Festa de Nanã no Livro de Expressões, da salvaguarda do patrimônio imaterial de Ponta Grossa, sendo deferido por unanimidade entre os conselheiros presentes. Na sequência, o Presidente passa para a pauta Devoção a João Maria, a qual ele é o relator e apresenta seu parecer: “em Defesa dos Devotos do Monge São João Maria. Os devotos do monge São João Maria têm sido guardiões de uma tradição espiritual que remonta a mais de um século e que possui uma profunda conexão com a história e a cultura da cidade de Ponta Grossa, do Estado do Paraná e do Brasil. É imperativo reconhecer e respeitar a fé e a devoção dessas pessoas, que encontram no monge uma fonte de consolo, esperança e orientação espiritual. Apesar de serem três, sendo João Maria de Agostini, João Maria de Jesus e José Maria de Santo Agostinho, o povo, por meio de lendas e folclore, uniu-os em um, que ficou conhecido como São João Maria, considerado na época o monge dos excluídos. Estão historicamente unidos de tal forma que muitas vezes é difícil separar seus feitos e suas vidas. Tinham em comum o fato de viver em épocas de grandes mudanças sociais, quando a assistência médica e a educação tinham pouca penetração no interior do país, e o aconselhamento embasado na religião, a cura por ervas, água e milagres eram os únicos recursos acessíveis da população carente e pouco assistida. Os humildes encontraram neles apoio para enfrentar a penúria e a desesperança. Mesmo sendo impossível tratar-se da mesma pessoa, pela questão temporal e geográfica, no caso particular do estado do Rio Grande do Sul existe a tese que de sobreviventes fugitivos, e em especial, seus descendentes, foram divulgando e adequando suas crenças e reivindicações. Assim, encontramos o monge João Maria, do movimento dos Monges do Pinheirinho, do município de Encantado, com as mesmas características, do qual inclusive existe registro fotográfico, 35 anos depois e com o mesmo nome, na luta dos Monges Barbudos, em Soledade. São João Maria, também conhecido como Monge João Maria, é uma figura reverenciada especialmente no sul do Brasil. Sua vida e seus ensinamentos são marcados pela busca incessante pela justiça social, pela cura espiritual e pelo cuidado com os mais necessitados. Seus seguidores mantêm viva uma tradição que enfatiza a compaixão, a solidariedade e a busca por um mundo melhor. Os devotos de São João Maria preservam rituais e práticas que são parte integrante da identidade cultural das comunidades em que vivem. Esses rituais não apenas fortalecem os laços comunitários, mas também oferecem uma continuidade histórica que é vital para a compreensão de nossa própria sociedade. A fé desses devotos não é apenas uma prática religiosa; já sendo, independente do resultado desta deliberação, um patrimônio cultural que merece agora ser valorizado e protegido. Infelizmente, em tempos recentes, temos visto uma crescente intolerância e falta de compreensão em relação às práticas religiosas que não se enquadram nas tradições majoritárias. Isso é um reflexo preocupante de uma sociedade que, muitas vezes, falha em reconhecer a riqueza da diversidade cultural e espiritual. O monge São João Maria que deambulava por Ponta Grossa no século XIX teria passado no local hoje destinado à sua devoção e por sua força espiritual, teria surgido um olho d’água no local. Desde então, milhares de devotos passaram a depositar ali muletas, fotografias, cartas, placas, imagens, partes do corpo em gesso e cera, óculos, etc, como votos ou ex-votos. Há ainda a crença popular de que São João Maria faz parte da vida dos moradores da cidade de Ponta Grossa desde a segunda metade do século XIX. Um exemplo de catolicismo popular e lenda urbana. O Olho D’água está localizado na Vila Ana Rita e reúne cerca de 100 visitantes por semana, segundo informações de populares devotos. Ao salvaguardarmos a devoção a João Maria, estamos apoiando a preservação de uma rica herança cultural e espiritual. Estamos defendendo o direito de cada indivíduo de encontrar significado e propósito na vida através de sua própria fé. E, acima de tudo, estamos promovendo uma sociedade mais inclusiva e tolerante, onde toda e qualquer forma de expressão religiosa será respeitada e valorizada. Em um mundo onde a intolerância ainda se manifesta de diversas maneiras, é nosso dever proteger e celebrar a diversidade de crenças e práticas espirituais. Existe um dia, protegido por lei, no estado do Paraná, sendo vinte e sete de março, dedicado a São João Maria. Então, como nesta seara, celebra pouco, ou quase nada, nesta data, é que nosso pedido sincero, conselheiros e conselheiras, nós queremos a Devoção a João Maria como patrimônio, não apenas a festa […]. Que possamos, então, continuar a defender e valorizar esta devoção, reconhecendo a importância de sua contribuição para a construção da nossa cultura, em Ponta Grossa e nos Campos Gerais, no Paraná. É o parecer”. O Presidente passa a palavra para a comunidade, que não se manifesta, então procede a votação para salvaguarda da Devoção a João Maria, a qual é deferida por unanimidade entre os conselheiros presentes, sendo registrada no Livro Expressões. Na sequência, o Presidente solicita que o relator da Festa do Divino, conselheiro Leonel Monastirsky, apresente seu parecer. Ele informa que este relato é baseado na pesquisa da tese de doutorado da professora Elizabeth Johansen. Ele relata que “a Devoção ao Divino Espírito Santo tem a sua origem em Portugal, quando a Rainha D. Isabel de Aragão, em função de uma crise que Portugal passava, pagou uma promessa no dia de Pentecostes de 1296 na Igreja do Espírito Santo na Vila de Alenquer, com doações e partilhas de alimentos com os mais necessitados. Esse ritual passou a se realizar todos os anos e, assim, a Devoção ao Divino surge acompanhado com atividades de caráter assistencial, na forma de festas, novenas, orações, músicas e bailados. No Brasil, em função da invasão e colonização portuguesa, a Devoção e as Festas do Divino remontam aos anos mil e setecentos. Há relatos que durante o século dezenove as Festas do Divino, que ocorriam em diferentes cidades, eram consideradas pelos brasileiros e estrangeiros como as mais populares do país. Esse reconhecimento se dá pela forma festiva e coletiva com que seus participantes se dedicam à devoção ao Divino vinculando-a a sua comunidade. Em Ponta Grossa há indícios que já havia devotos do Divino desde a década de mil, oitocentos e setenta, mas a devoção se fortaleceu, quando, em mil, oitocentos e oitenta e dois, surgiu a notícia de que a Srª Maria Selvarina Julio Xavier teria sido milagrosamente curada por ação do Divino, depois de encontrar a imagem do Espírito Santo, uma pomba de asas abertas. A notícia de sua cura se espalhou e a partir deste acontecimento, no transcurso de cento e quarenta e dois anos, práticas devocionais foram mais bem organizadas, algumas próprias da Casa do Divino, outras comuns à devoção ao Espírito Santo existentes em muitas outras cidades brasileiras. Ao longo desses anos, a Festa, inicialmente era realizada somente com os devotos e pessoas simpatizantes; mas, com a liderança da Sr.ª Lídia Hoffmann Chaves e a participação do Bispo Dom Sérgio Artur Braschi, ocorreu então a participação da Igreja nas Festividades, ainda que a Casa do Divino se mantivesse independente da estrutura da Igreja Católica. A Festa do Divino, também é conhecida como Império do Divino, Festa do Espírito Santo, Festa do Coração ou Folia do Divino, possui em cada lugar características próprias que também se adaptam com o tempo. As atividades geralmente começam oito dias antes com novenas diárias, sendo a última novena culminando com a festa em honra ao Divino Espírito Santo no domingo de Pentecostes, cinquenta dias após a Páscoa. Neste dia, acontece o café da manhã com bolos e o famoso pastel. Depois transcorre a saída da Procissão em direção a Catedral com os devotos trajando blusas vermelhas e carregando o Ostensório, Estandartes e a Bandeira, símbolos sagrados que as pessoas buscam contato ao longo da procissão, tocar a bandeira é uma forma de aproximação com um dos maiores símbolos da Devoção, quando as pessoas se sentem abençoadas. Além dos devotos, acompanham a procissão músicos violeiros e gaiteiros, crianças vestidas de anjos e demais pessoas, ou seja, uma manifestação religiosa que tem forte ligação com a arte popular. Depois da celebração da missa na Catedral, a partir de meio dia, começam as atrações musicais e a venda de pasteis, bingos, rifas e lembranças do Divino. A última das novenas acontece no meio da tarde. Ainda associado à festa, é comum, ao longo do ano, os devotos, músicos e cantores, levarem os estandartes e Bandeira do Divino às casas, ruas, bairros e áreas rurais. Entram nas residências que são convidados e depois de abençoar com a Bandeira os proprietários e seus pertences, recolhem donativos para a realização da festa. Ao término das orações e dos cantos sempre é oferecida pelos donos da casa uma mesa farta com doces e salgados para os Festeiros. A Festa também acontece na zona rural do município de Ponta Grossa: Mato Queimado, Cerrado, Biscaia e Roça Velha. Em Ponta Grossa, atualmente o percurso da procissão é significativo para muitos devotos, pois é o momento em que o representante da hierarquia eclesiástica católica, o Bispo Diocesano, reconhece publicamente a devoção popular dirigindo-se até o local principal da sua realização, a Casa do Divino, e lado a lado com os devotos, conduz o ostensório até a Catedral de Sant’Ana para a realização da missa de Pentecostes. Também é o momento em que a devoção é demonstrada publicamente para as demais pessoas da cidade, pois ela extrapola as salas da Casa do Divino. Em linha geral, os elementos estruturantes da festividade são mantidos: a participação dos devotos em todos os momentos da organização e realização da Festa; a procissão pelas ruas da cidade; a celebração da missa na Catedral de Sant’Ana; as apresentações musicais e de dança; as rifas para angariar recursos; as barraquinhas com comidas e bebidas e a Casa do Divino aberta durante toda a Festa para que o devoto tenha a oportunidade de fazer suas orações diante do Ostensório ou da Bandeira. Isto posto, cinco fatores justificam o Registro da Festa do Divino enquanto Patrimônio Cultural Imaterial de Ponta Grossa: um, os Devotos, são os devotos que frequentam a Casa do Divino, estruturam sua fé e desenvolvem suas práticas referentes à Devoção e à Festa. São participantes de uma atividade religiosa e cultural que faz sentido para as suas vidas. São os devotos que mantém viva a tradição dessa Devoção e Festa por mais de um século; dois, a sociedade, as pessoas de forma geral, religiosas ou não, percebem a existência histórica, a importância e a simbologia da Devoção ao Divino, a Casa do Divino e, sobretudo, a Festa do Divino, de maior visibilidade; três, o COMPAC, o Poder Público Municipal, por meio do COMPAC, reconheceu a Casa do Divino enquanto Patrimônio Cultural em dois mil e quatro, pois a Casa do Divino é o lugar de umas das maiores manifestações religiosas e culturais da cidade. Cabe lembrar que todo patrimônio Cultural Material possui, na sua essência, imaterialidades: a Devoção ao Divino e a Festa do Divino, são, entre outras, as mais importantes; quatro, reconhecimento da Igreja Católica: D. Sérgio Arthur Braschi, então Bispo de Ponta Grossa, declarou que a Paróquia de Sant’Ana deve sempre manter a ligação com a Casa do Divino, que é algo histórico, uma riqueza da nossa cidade, da nossa região e que precisa ser cultivada, conhecida, para que a Casa do Divino continue a existir e prestando seu serviço de polo da devoção ao Divino Espirito Santo; e cinco, a Profª Elizabeth Johansen considera na sua tese que por mais que se afirme que a Casa do Divino é um patrimônio cultural, ou seja, reconhecida enquanto tal, a partir da forma simbólica da religião, seus outros elementos jamais se desconectam, pois, a linguagem, o mito e a arte se inter-relacionam. Assim, uma das principais buscas por ela, e por pessoas que valorizam e defendem a salvaguarda do Patrimônio Cultural de Ponta Grossa, é se dedicar para que a cidade tenha também o reconhecimento, a manutenção e a proteção de seu patrimônio cultural imaterial. É o parecer”. O Presidente passa a palavra para as considerações da comunidade, mas novamente sem inscrição, inicia a votação para o registro de salvaguarda da Festa do Divino, como bem imaterial, no Livro Expressões, a qual é deferida por unanimidade entre os conselheiros presentes. O Presidente do conselho, Alberto Schramm Portugal, agradece ao COMPAC por reconhecer e garantir a perpetuação da história, da memória e do rico patrimônio imaterial da cidade de Ponta Grossa, declarando encerrada a sessão, às dezenove horas e trinta minutos.


Alberto Schramm Portugal___________________
Andreza Lima Gonçalves de Oliveira_________________
Brenda Ascheley de Morais__________________
Carolyne Abilhôa______________________
Daluz Aparecida Ribeiro____________________
Eliane Terezinha de Oliveira___________________
Geraldo Lucas Agner_____________________
Johnny Willian Pinto____________________
José Aparecido Leal____________________
Juliano da Rosa_____________________
Kathleen Coelho de Biassio__________________
Larissa Pickler Barbosa___________________
Leonel Brizola Monastirsky__________________
Leontina Mendes Stadler____________________
Lorran Dyowany Jasluk de Melo__________________
Luis Cláudio Moutinho____________________
Maria Luiza Côrtes_____________________
Milena Rocha_______________________
Renato Van Wilpe Bach___________________
Rodrigo Muller______________________

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