Footing da Rua XV
No final da década de 1930, apenas 3 quadras separavam dois dos maiores cinemas do estado do Paraná. O Cine Renascença, conhecido como o Cine Líder da Cidade e o Cine Éden chamado de O Grande Cinema de Ponta Grossa. Ambos traziam em suas programações grandes produções hollywoodianas que levavam, numa única sessão, centenas, até mesmo milhares de pessoas, consolidando o cinema como a maior forma de entretenimento do século XX. No espaço compreendido entre os dois grandes cinemas, ocorria um outro fenômeno, característico das primeiras décadas do século XX: o footing.
O footing poderia ser descrito como um ritual que consistia numa caminhada, um ir e vir, num pequeno trecho, no caso de Ponta Grossa, demarcado pelos dois cinemas e tendo como palco principal a rua XV de Novembro entre as ruas Augusto Ribas e Sete de Setembro. O fenômeno do footing foi uma prática que, em sua maioria, ocorreu próxima aos cinemas, para os quais jovens rapazes e moças se preparavam com o máximo esmero, a fim de ver seus ídolos da tela e, antes ou depois da sessão, flertar durante o trajeto, com aqueles ou aquelas que poderiam vir a ser seus futuros maridos ou futuras esposas.
A aglomeração no entorno dos cinemas, quando este era a grande fonte de entretenimento para os jovens, era constante nas matines e sessões noturnas dos finais de semana, quando os romances açucarados e as heroicas aventuras das telas, estimulavam ainda mais o footing e a busca por uma conquista durante o mesmo. A geração das pessoas que hoje estão na fase octogenária de suas vidas, lembra do footing da rua XV como uma atividade social e um momento de lazer, quando os carros ainda eram artigos de luxo e as pessoas investiam no seu visual de domingo para ir ao cinema. Muitos e, principalmente muitas, imaginavam encontrar no footing da rua XV um Clark Gable ou um Rodolfo Valentino, um romance como aquele vivido pelos personagens do filme e não foram poucos aqueles e aquelas que encontraram na caminhada cadenciada e sem compromisso, entre o Renascença e o Éden (depois substituídos pelo Inajá e Ópera), os pares de suas vidas.
O footing como uma prática, um ritual, fez parte de um estilo de vida, de um momento histórico e social das cidades que tinham um cinema, um teatro, um coreto, uma praça, um clube, espaços de convivência que aproximavam as pessoas e geravam hábitos, costumes, comportamentos, típicos das gerações da primeira metade do século XX.
Assim como os Cinemas de Rua foram desaparecendo e dando lugar a outras formas de entretenimento, as pessoas que praticavam o footing foram se enclausurando em suas casas diante da televisão, adaptando-se a novas tecnologias. Esvaziando as ruas que um dia testemunharam encontros e desencontros de uma geração que viveu o encantamento das grandes aventuras, dos grandes romances, dos grandes dramas, proporcionados pelo cinema e pela nossa capacidade de “caminhar” em busca de um sonho.
Texto: Nelson Silva Junior